quarta-feira, 9 de setembro de 2020

MINISTÉRIO DA LEI DE MOISÉS ADVERTE (REPOST)

DISCLAIMER: Estava pensando em diminuir os cigarros, quando me lembrei deste antigo conto de quase onze anos atrás, data original 29 de Setembro de 2009. Me pareceu não ter qualquer indicativo de muita controvérsia ou possível CADEIA, como outros (eram tempos diferentes).  Então, vou repostar, em homenagem.


Bom, como todos sabem, vivemos na Neo Babilônia. Nosso grande Império adota uma série de leis, dentre elas a Lei de Moisés. Ontem estava conversando com o Lázaro, muito proficiente nos mecanismos judiciários, que me repassou este impressionante aviso do serviço público da Neo Babilônia que transcreverei aqui.

 
LEI DE MOISÉS E O CIGARRO
Um caso Verdadeiro.
Aqui é a Lei de Moisés, amigo.

Olá. Meu nome é Artabanus, residente do D2 na Neo Babilônia. Minha história começa quando eu estava nos meus vinte anos de idade. Eu tinha vários projetos em mente: Meu próprio lugarzinho pra morar, terminar minha faculdade de direito, uma namorada legal... E quem sabe um carrinho pra dar umas voltas por aí, né?

Comecei a me empenhar. Meus pais me deram todo o apoio, apesar de nenhum centavo. Depois de batalhar pra caramba, consegui um estágio no Fórum da Neo Babilônia. Comecei a ajudar com as contas em casa, me enturmar com o pessoal do trabalho. As coisas foram melhorando e um dia numa festinha da UFNB, meu colega de trabalho e melhor amigo Sargon me apresentou Ellasar, a garota mais interessante que eu conheci na vida. Ela era caloura das ciências sociais. A gente começou a se ver pelo campus, e logo estávamos namorando. Consegui dar entrada no meu carrinho e logo estava motorizado.

Ellasar, minha namorada.

O tempo passou, me formei e peguei um cargo concursado no Fórum. Eu e Ellasar alugamos nossa própria casa e passamos a morar juntos. Casamos. A gente fazia tudo em perfeita harmonia. Ela fumava às vezes, e eu acabei experimentando. Gostei da sensação. Acabei me viciando, era legal, algo a mais pra relaxar das preocupações diárias. Então veio o melhor presente da minha vida: Cambyses, nosso filho.

Depois de mais uns anos as coisas começaram a mudar. O fardo de Cambyses foi o mesmo que o meu, o cigarro. Ele nasceu com alguns problemas pulmonares e tinha crises de asma com frequência. A preocupação aumentou o número de cigarros, assim como a luta para acumular dinheiro para comprar novas coisas e adquirir uma casa maior. Com o passar deste tempo minha relação com Ellasar esfriou um pouco... Nunca tínhamos brigado por longos períodos ou nos separado temporariamente, mas parecia que estávamos nos distanciando. É que eu estava com um problema sério. Eu já não tinha todo aquele desempenho sexual da época em que namorávamos. Eu e Ellasar sempre resolvemos nossas diferenças na cama, o melhor sexo é o de reconciliação. Achei que era o stress da vida, falta de exercício, sei lá. Consultei vários psicólogos, pensei em tomar remédios, mas nada adiantava. Eu chegava em casa cansado e só queria dormir abraçado com minha esposa. Nas poucas vezes que eu estava no clima eu falhava no meio do caminho. Logo Ellasar começou a dizer que estava cansada... Com dor de cabeça... Estava um inferno. Minha única saída para não ficar louco era fumar um cigarrinho.

Foi então que tomei uma decisão antes que fosse tarde demais. No aniversário de nosso casamento, resolvi sair mais cedo do trabalho. Reservei uma mesa no Hammurabi's e estava preparado pra levá-la ao motel Assírio. A possibilidade de reacender a chama de nosso amor me deixava extasiado, até fumei uma carteira de cigarro a mais naquele dia de tanta empolgação.

Eis que chego em casa como de costume e escuto uns ruídos estranhos no nosso quarto. Primeiro achei que fosse um ladrão mexendo nas coisas, então fiquei apreensivo. Acendi um cigarro pra me acalmar e abri a porta.

Reconstituição da cena, com mais roupas e menos sexo.

Fiquei transtornado. Minha mulher e meu melhor amigo na cama. Sargon olhou pra mim rindo, atracado com ela. Ellasar estava de olhos fechados, gemendo e com cara de quem estava gostando muito, algo que apenas aumentou meu horror. Gritei com os dois, que não tiveram nem a decência de parar de transar pra falar comigo. Angustiado, tentei tirar Sargon de cima dela mas ele me empurrou com uma das mãos e caí no chão com pouco fôlego. Ele terminou, pegou as roupas e foi saindo pela porta da frente cantarolando. Ela se encostou nua na cama e acendeu um cigarrinho pós-sexo. Eu não tinha forças nem cabeça para sequer argumentar.

Fui para o quarto de Cambyses, e vi que ele não estava bem. Estava tendo uma crise séria de asma. Quando o peguei em meus braços, vi que estava respirando muito pouco. Vestida com um roupão, Ellasar disse que o levaria ao hospital no carro dela. Eu a afastei com os cotovelos e disse que levaria Cambyses no meu velho carro. A cada minuto que eu passava dirigindo, eu olhava para trás e via que meu filho estava cada vez pior. Por volta de trezentos metros de distância do hospital, meu carro falhou. Olhei para os lados, a rua estava vazia. Ninguém poderia me socorrer ali. Peguei Cambyses mais uma vez e decidi correr até o hospital. Corri o máximo que eu pude, mas em cento e cinquenta metros eu já não aguentava mais. Tive que parar para recuperar o fôlego, e depois novamente aos duzentos e cinquenta metros. Quando eu cheguei no hospital e estava para entregá-lo aos médicos, já era tarde demais. Cambyses não respirava mais. Os médicos ainda tentaram o possível, mas sua morte foi marcada em meus braços.

Depois disso, minha mulher me deixou. Caí em depressão, perdi meu emprego, meus amigos, minha vida. Morei na rua por anos catando chepa de cigarro em bueiros para poder fumar, me prostituí. Fui resgatado e tive que voltar pra casa dos meus pais com mais de quarenta anos na cara. Por muito tempo culpei meu carro pela morte do meu filho, mas no fundo eu sabia que quem tinha falhado era o pai. Por causa do maldito cigarro.

Hoje estou trabalhando de secretário numa pequena firma de advocacia, e me juntei com Sheba, que muito ajudou a me livrar do cigarro. Posso dizer com orgulho que não fumo há dois anos.

Sheba.

Posso não estar feliz, e sei que nunca vou ter as coisas que eu amava de verdade de volta, mas pelo menos aprendi minha lição. Eu sou Artabanus, e este é meu depoimento.

O Ministério da Lei de Moisés Adverte: Fumar pode roubar sua mulher e matar seus filhos.

quarta-feira, 1 de abril de 2020

Certo dia no Apocalipse Viral

Certo dia no Apocalipse Viral- Parte I



Corona-Chan, em toda sua glória.


AVISO: CONTEÚDO IMPRÓPRIO. LINGUAJAR CHULO E SITUAÇÕES APIMENTADAS. HUMOR ÁCIDO E DE MAU GOSTO. TIREM AS CRIANÇAS DA SALA.


Pow. A rebordosa dessa vez foi selvagem. Depois que ajudei a organizar a copa do mundo de 2014, descobriram que a falta de internet seguida do apagão no estádio do Maracanã foi falha do seu Valdir. Eu paguei duzentos conto pra ele fazer a fiação e instalar a internet, preço muito acima do mercado, e ele me dá uma dessas! O pior foi que aqueles cartolas filhos da puta, ao invés de punir o responsável, jogaram toda a culpa em mim, que só paguei o seu Valdir. Sacanagem. 

Antes que eu pudesse fugir do país com o dinheiro que sobrou do contrato da fiação, a polícia federal me pegou. Lançaram uma investigação e logo souberam que comprei uns quilinhos de pó na fronteira. Eu disse que era pra consumo, mas não acreditaram. Depois descobriram que eu tava no dia que o Colisor de Hádrons deu pau e que eu posso ou não ter sido responsável pelo vazamento da usina de Fukushima. Falei que foi tudo culpa do meu colega de emprego, mas eu não lembrava mais o nome dele. Quando eu disse que ele era tipo o Dhalsim só que de bigode, ainda me tocaram uma acusação de racismo pra fechar com chave de ouro. Só me fodo nessa merda.

Consideraram reabrir o tribunal de Nuremberg especialmente pra mim, mas felizmente eu tinha uma carta na manga: o telefone de São Raposo, o patrono dos heróis, advogado mundialmente conhecido. Por acaso quando eu estava em Marrocos negociando armas em 2008 eu topei com ele numa orgia e ele me deu um cartão laminado com o telefone dele que até hoje eu usava como arma de corte quando a coisa apertava.

São Raposo é tão fodanchado que até conseguiu manter o assunto longe da mídia, os arquivos do caso guardados no codex proibido do Vaticano. Mas mesmo assim acabei pegando duzentos anos de cadeia em segurança máxima numa solitária. Pelo menos não me executaram, então tá bom.

Só sei que nesse tempo todo preso, desde 2014, quebrei meu braço umas três vezes de tanto bater punheta. Não tinha muita coisa pra fazer trancafiado, além de praticar arte fecal nas paredes, claro. Uma das minhas pinturas foi inclusive fotografada pelo psiquiatra do cadeião e ele vendeu a foto para o Louvre, com o nome de "Merde du jour", e fez uns milhões nas minhas costas. Eu jurei que a primeira coisa que eu ia fazer se eu saísse daqui um dia seria caçar o Doutor Praxedes pra pegar minha grana da pintura. Justo meu primeiro trabalho totalmente dentro da lei, e me passam a perna!

Até que em março de 2020 minha sorte mudou. Chegou um cara com uma roupa anti-radiação na solitária querendo bater um papo comigo.Já perguntei:

-E aí camaradagem, qual vai?

-Senhor... Mocassino?

-Isso mesmo, chefe. Valdisnei Mocassino, ao seu serviço!

-Me chamo Jacinto Bulhões de Carvalho, adeivogado do ministério da justiça.

-Prazer, carvalhudo.

-Não sei se o senhor sabe, mas estamos com uma pandemia no mundo. Corona-chan virus é o nome e já infectou, de acordo com os dados oficiais, "Um putilhão de pessoas'.

-Tabaco, heim?

-A situação é séria... E queremos saber se o senhor é o responsável.

-De que jeito, homem?

-Seu... Talento para "foder com o mundo", acredito que este seja o termo oficial usado no site da CIA, é temido e até mesmo adorado por todo o globo.

-Adorado? Sério?

-Sim, o Mossad teve que desmantelar um culto em Birigui, São Paulo, que lhe ovacionava tal como um Deus. Lá encontraram muitas armas e cocaína.

-Já se vê que essa gente não me conhece! Essas coisas são pra vender, não pra usar. Pode me passar o telefone deles? Quem sabe posso dar uma mão.

-Absolutamente não! E não desvie da conversa, queremos saber se você está por trás do Corona-chan vírus.

-Minha formação é de astrofísico e engenheiro nuclear, não sei nada de vírus.

-Mas é certo que o senhor mantinha uma rede de contrabando de animais selvagens com contato direto com o mercado negro da China, não é?

-Não sabem como foi difícil enfiar um celular no cu e fazer um gato aqui na solitária pra recarregar a bateria. Eu tava só juntando uma grana pra quando sair daqui e ter como me levantar, sabe? Pegar um trabalho honesto, casar, ter filhos...

-Pois saiba que o senhor pode ser responsável pelo Corona-chan, ou não. Não temos como confirmar. Então é por isso que estou lhe questionando da natureza do seu negócio.

-Ah, cara, e eu vou saber? Só joguei a grana na mão dos caras pra eles tocarem o negócio e acompanho meu saldo de bitcoins, que é pra não dar nas vistas. Agora é só criptomoeda que minhas contas nas Ilhas Caimã foram bloqueadas.

-Certo. Então não sabe que tipo de animal era traficado?

-Sei lá, cara. Mangusto, pelicano, mastim napolitano, pangolim-mirim, naja de sete cabeças, morcego vampiro da Romênia... Essas parada. E essa roupa aí de anti-radiação? O Corona-chan é brutal assim?

-Não, gripezinha. Estou usando é pelo cheiro desta sua cela, de paredes cobertas de fluídos de prazer e excremento artístico.

-Sabe que eu me acostumei?

-Tá, tá bem, Valdisnei. O senhor tá liberado. Mete o pé.

-Sério? Posso vazar?

-Estão liberando os presos por causa da Corona-Chan, e o seu adeivogado, o São Raposo, achou uma brecha para te colocar na rua.

-Abençoado seja São Raposo!

-Mas vai ter que usar uma tornozeleira e um drone senciente vai te acompanhar até acabar a praga.

-Show.

E foi assim que eu consegui sair da cadeia. Mr. Roboto até que é um cara legal, para um drone senciente. Ele tem um compartimento com um canivete suíço, que usei pra me livrar da tornozeleira. E agora que estou na rua, é hora de entender o que é essa praga que eu posso ou não ter causado, e mais importante, ir atrás do Doutor Praxedes pra conseguir o dinheiro da minha pintura excremental, pois eu, Valdisnei Mocassino, sou brasileiro e não desisto nunca!



Mr. Roboto, drone senciente.

Fim da Primeira Parte