sábado, 29 de maio de 2021

CONTOS ILLUMINATI PARTE 2

CONTOS ILLUMINATI 

PARTE I


II: O COMEÇO DO MEIO




Brito Camacho.


Um cliente desesperado. Uma Webnamorada desaparecida. Tudo apontava na direção de um caso sem complicações. Já conseguia visualizar a coleta do pagamento assim que eu desmascarasse a tal "garota", de nome Annie May, como a pilantra que era. Meus instintos diziam que não passava de uma golpista pútrida dos confins mais depravados da internet, se é que era uma mulher em primeiro lugar. Uma vez na grande rede de informações e com o preparo adequado, qualquer pessoa pode ser... Qualquer outra pessoa.

Mas as complicações começaram no momento em que o cliente, Dalton Fitzpeter, deixou o meu escritório. Mal virei as costas para checar meu computador de trabalho quando escuto gentis batidas na porta. Achei estranho, pois a maioria dos casos eram combinados por telefone ou e-mail antes de uma entrevista propriamente dita e não lembrava de nada adicional marcado para aquele dia. Atendi o chamado e deparei-me com uma bizarra figura. Tomado pela estranheza não consegui emitir qualquer palavra, o que fez aquela pessoa tomar a inciativa.



Golgotha Raventears


-Bom dia, sensei.; Disse ele, com um inquietante sorriso de canto de boca.

Algo não estava certo. Não sei se era pelo homem de meia-idade maquiado como a arara de estimação da morte ou pela voz forçada que lembrava um adolescente tentando falar grosso.

-O que quer aqui, senhor...?

-Golgotha. Golgotha Raventears. Acredito que você seja o sensei Camacho?

-Sim, sou Camacho. Brito Camacho. Mas não sei desta história de "sensei".

-Vai me fazer implorar para estudar, sensei? Como nos antigos filmes de kung-fu? Se for o caso, cairei de quatro aqui mesmo.

O pica-pau das trevas imediatamente foi de joelhos ao chão emitindo um "ai!" desafinado e agarrando minhas pernas. Atrás dele, com a porta do escritório aberta, pude ver o corredor do prédio. Na frente da minha firma de detetive particular existia um consultório médico. Era o final do expediente e pude ver a recepcionista, Rodriga Loverjoice, nos encarando com um misto de surpresa e repulsa. Que rebordosa.


Rodriga Loverjoice.

-Sensei! Sensei! Me aceite, Sensei!; Gritava escandalosamente a escabrosa figura pendurada em minhas calças, balançando a cabeça para frente e para trás.

Demorei semanas para conseguir firmar uma conversa de elevador com Loverjoice e já havíamos tomado um café juntos no botequim da esquina. Estava tentando juntar coragem para convida-la a sair uma noite dessas... E agora este periquito de coveiro estava pondo tudo a perder. Antes que a situação se agravasse ainda mais, puxei Golgotha pelo colarinho e o arremessei para dentro do escritório. Quando fui falar com Loverjoice, ela já havia tomado o elevador. Sentindo uma das veias na minha testa prestes a explodir, tentei acalmar-me para não lançar os punhos no trevoso. Ainda bem que conhecia os segredos do módulo da Calma Transcendental.

-Escuta aqui, palhaço...

-Palhaço não!; Interrompeu-me Golgotha, levantando-se rapidamente num kip up; -Os góticos e os palhaços são inimigos naturais. Não me confunda com uma destas bestas.

-Tanto faz. Aqui é uma firma de detetives e estou ocupado com um caso. Não sou sensei de nada.

-N...Não??; Raventears parecia genuinamente chocado; Mas na internet digitei "academia de Pa-Kua" e este lugar aparecia como a primeira sugestão, completa com seu nome, Camacho.

-Deve ser um engano, nada mais. Mas por curiosidade me diga, pelo seu kip up você já parece saber de artes marciais. Alguma razão especial de procurar Pa-Kua?

-Sabe o que é, Camacho? Nós góticos somos odiados e incompreendidos...

-Ah, entendo; Adiantei-me; Você quer aprender a se defender de ameaças físicas com uma verdadeira arte marcial.

-É que atualmente as pessoas não estão nem aí para os góticos. Ninguém quer fazer bullying comigo, acham minha roupa até chique. Mas o poder da nossa tribo vem da incompreensão e ódio, como falei. Nos torna mais fortes, nos dá uma reserva de poder místico. Pensei que se fizesse Pa-Kua, o bullying recomeçaria e eu me banharia mais uma vez na energia do escárnio alheio.


Pa-Kua.

-... Fora daqui. Agora.

-Uuuh, sensível. Sabe, Camacho, você daria um bom gótico. Já até sabe Pa-Kua. Posso recomendar um álbum do The Cure para você?

-Fora!

Com o papagaio da escuridão longe do meu escritório eu poderia trabalhar tranquilo. Mas uma coisa não saía da minha cabeça. Minha firma estava constando como uma academia. Então me bateu, tal como um soco de uma polegada. Imediatamente liguei para o comissário Mountbatten que informou o que eu já temia: O "Cagador Misterioso", facínora que depredava escolas de Pa-Kua, havia fugido da cadeia tempos atrás.

A relação era clara. Eu o prendi. Ele queria vingança. Marcou meu lugar de trabalho como uma academia para ter o prazer de invadir e cagar na minha mesa.

Isso não ficaria assim. Eu estava um passo a frente e defenderia o escritório não com socos e pontapés, mas com Vigilância. Vigilância foi o nome que dei ao meu fiel três oitão, que imediatamente puxei da gaveta e municiei.

Decidi não voltar para casa. Eu trabalharia no caso Annie May durante a noite toda e ficaria de tocaia caso o "Cagador Misterioso" desse as caras.

Oh, e por Deus, como eu queria que ele cruzasse minha porta...



FIM DA PARTE II

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